quarta-feira, 16 de novembro de 2011

ACAMPANDO NO CERRO PARTIDO

O Cerro Partido está situado no município de Encruzilhada do Sul RS e sempre foi um local onde desejei acampar. Por sua exuberante natureza, localização privilegiada e sua altitude um pouco mais elevada em relação aos outros cerros da região, sempre imaginei como seria passar uma noite de lua nova, acampado nesse "oásis", para contemplar o céu noturno visto de lá, já que a interferência das luzes das cidades que o circundam é mínima.

 No mês de junho de 2011 eu e dois grandes amigos, Régis e Jonas, acabamos por realizar tal façanha. Saindo de bicicleta às 5:00 da madrugada do centro de Encruzilhada do Sul, pedalamos 35 KM pela estrada do Chanã até chegarmos aos pés do Cerro partido.












Todo o percurso é muito bonito, a estrada com pouquíssimo fluxo de automóveis e com paisagens encantadoras das fazendas da região, com certeza foram um atrativo a mais em nossa pequena aventura.











Criação de ovelhas, uma das marcas do município de Encruzilhada do Sul.


O Cerro Partido está cercado de propriedades particulares, logo para termos acesso ao seu platô, contamos com a permissão do Sr Teobaldo, proprietário de uma das fazendas que se situam no entorno do Cerro.

Depois de desfrutarmos da hospitalidade do casal e de ouvirmos algumas histórias impagáveis do Seu Teobaldo e da Dona Naida, deixamos as bikes na fazenda e rumamos na trilha que nos levaria a parte mais alta do cerro, onde não tivemos dificuldade para encontrar um lugar estratégico para acamparmos. Com uma vista de tirar o fôlego e protegidos da vento por um capão, em pouco tempo estávamos instalados no topo do Cerro Partido. 


À partir dai tivemos uma tarde ainda mais agradável onde acabamos por explorar e contemplar a fascinante natureza do local, cevando um bom chimarrão para espantar o frio daquelas paragens.


Conforme a noite foi caindo, as previsões climáticas baseadas em imagens de satélite foram se confirmando ou seja; as nuvens foram se dissipando no céu e o final da tarde no Cerro Partido foi um espetáculo que marcou aquele dia e que viria anunciar, assim como havíamos desejado: uma noite de lua nova, céu limpo, sem vento e para a nossa surpresa, com o frio da tarde se tornando mais ameno. Daquele momento em diante, tive a nítida sensação de que já havíamos recebido o que afinal tínhamos ido buscar, quando nos aventuramos em "retiro", no platô do legendário Cerro Partido.


Muitas vezes as pessoas não entendem o quê leva, aqueles que gostam de uma boa aventura, a deixarem, mesmo que temporariamente, o aconchego de seus lares para dormir em uma barraca sem os mesmos recursos e conforto de uma casa. É nessas horas; quando vivenciamos certos espetáculos da natureza e que só podemos contemplar quando rompemos com o conforto dos nossos lares, é que temos a certeza de que os "sacrifícios" se tornaram insignificantes diante de tanta beleza!



Assim caiu a noite em nosso primeiro dia no Cerro Partido, vivenciando a companhia de velhos e bons amigos, boa conversa, gargalhadas e reflexões inspiradas pelas labaredas da fogueira. Cansado sim, mas realizado na simplicidade de um ritual que consiste em apenas observar; em apenas existir...


"algo fica acercando-nos na luz da vida
como se o selo da noite assinalasse
com fogo suas secretas criaturas".
Pablo Neruda.




"Cansado de contar os meteoros, eu adormecia dentro de um fosso. Quanto a ele(meu avô)permanecia sentado, a cabeça erguida, girando imperceptivelmente com os astros...que eram para ele pontos inflamados , objetos como as pedras, ou os vagarosos insetos dos quais ele tirava os presságios, partes constituintes de um universo mágico que abarcava também as volições dos deuses, a influência dos demônios e o quinhão reservado aos homens.

Memórias de Adriano - Marguerite Yourcenar. 

terça-feira, 8 de novembro de 2011

Viagem Serra do Sudeste / Lagoa dos Patos - parte 4





Chegando em Arambaré nos dirigimos a casa que alugamos com o Sr Osmar da Pousada Arambaré    http://www.pousadaarambare.com.br/ que nos recebeu muito bem e nos indicou o Restaurante Pulperia http://www.turismo.rs.gov.br/portal/index.php?q=estabelecimento&mun=&cod=&te=&opt=&id=9025&fg=3&ts=     onde saboreamos um filé de traíra com um acompanhamento, que nos restabeleceu as forças investidas nos 80 KM pedalados naquele dia, sob condições extremas de sol forte e estradas em construção.
Após uma noite de sono, às 6:30 da manhã já estávamos à postos e nos preparando para enfrentar o quê viria à ser o dia mais emocionante de nossa aventura pela Lagoa dos Patos.




Com o intuito de fugir da movimentada BR 116, era nosso plano desde quando essa viagem foi pensada, que faríamos o trecho Arambaré/São Lourenço do Sul por estradas de chão que se situam mais próximas à Lagoa dos Patos e onde poderíamos desfrutar melhor da sua exuberante natureza. Com certeza essa foi a mais acertada de todas as decisões que tivemos de tomar.



  




















A pedalada aqui se mostrou muito agradável, com a estrada sem fluxo de automóveis e toda ela em terreno plano, uma verdadeira experiência de interação com a fauna e a flora da várzea da Lagoa dos Patos.



























Em 20 KM pedalados chegamos ao canal de Santa Rita do Sul


Daqui pra frente mais 30 km até a localidade da Pacheca onde faríamos o descanso para o almoço e logo após atravessaríamos o Rio Camaquã com a balsa.




Momento de descontração no interior do Armazem Barcelos.  




Chegando na balsa da Pacheca uma surpresa que quase põe fim em nosso objetivo de chegar até São Lourenço do Sul. Logo ao nos aproximarmos do local da balsa, encontramos um morador que nos recebeu com uma notícia desanimadora: "olha pessoal, a correnteza do rio está muito forte e a balsa não está passando". Foi mais que uma balde de água fria em nossos planos; já havíamos feito 45 km de Arambaré até ali e tínhamos que percorrer mais 45 km até nosso destino ou seja, São Lourenço do Sul. Uma coisa é você fazer essa quilometragem  em direção ao seu objetivo, a outra é faze-la pra retornar ao ponto de partida, com todas as frustrações que isso implica. Confesso que um desanimo quase que absoluto tomou conta de mim naquele instante, muita coisa já tínhamos superado até ali, só pra citar duas: o odômetro do meu ciclo computador já marcava quase 200 km pedalados desde a saída de Encruzilhada do Sul até ali, sendo que 140 destes, fiz com meu braço em  condições nada favoráveis, de quem sofreu um acidente com deslocamento do mesmo em relação ao ombro e isso já no primeiro dia de viagem. Logo, naquele instante perdi o "horizonte" do quê fazer(?); mas meu amigão Mário não; o cara começou a bater de casa em casa até achar o "Anjo Daniel" ou melhor Daniel Schiavon Silva, esse é o nome dele, um morador da Pacheca que junto com seu amigo, o Seu Hélio Gonçalves, barqueiro "matreiro" do Rio Camaquã, nos devolveu o sonho de chegar a São Lourenço do Sul via estrada da Pacheca.






Seu Hélio




                      


























Seu Hélio, Mário, Daniel e Luciano, são e salvos e já na outra margem do "Velho Camaquã".








É incrível como em uma viagem dessa natureza, nós reforçamos ainda mais a ideia da interdependência de todas as coisas. Aqui se você não sair do individualismo ao qual a vida na cidade acaba por forjar-nos, você não vai muito longe não. É preciso romper as amarras do egoísmo e se entregar para um outro"nível" de experiência, onde tem de haver cooperação e acima de tudo humildade para reconhecer que seu desejo e seu caminho, dependem e também passam por mãos alheias. Fiz pessoalmente, mas gostaria também de deixar aqui o meu sincero agradecimento; muito obrigado Daniel, muito obrigado Seu Hélio!!!


Devia ser umas 15:00 quando enfim atravessamos o Rio Camaquã, de margem à margem bem mais largo e com maior volume de água do que eu já tinha o visto em outros pontos, como por exemplo no Passo da Guarda em Encruzilhada do Sul; motivo este por já estar quase no final de seu curso, bem mais perto de desembocar na Lagoa dos Patos e enfim dissolver-se no "Mar de Dentro".


Pra nós ainda havia 45 km de pedalada até São Lourenço do Sul e uma sanga por atravessar, coisa que ao contrário do barqueiro que não quis nos passar, o Seu Hélio e o Daniel disseram que conseguiríamos sem maiores riscos. Então lá fomos nós...



  Depois de todo esse perrengue veio uma estrada de várzea muito bonita e com paisagens não menos deslumbrantes das que já havíamos visto antes, uma chuva mansa que por nenhum momento nos desanimou, mas muito pelo contrário foi sentida como uma benção depois de tantas lutas. Foram os 45 km finais daquele dia onde falamos menos e contemplamos mais; atitude totalmente justificável depois de tudo que passamos não só nesse dia -que foi muito especial- mas por tudo que tínhamos vivenciado até ali... 





Chegamos em São lourenço do Sul quase ao cair da noite e nenhuma bateria mais na câmera digital para o devido registro, mas eu particularmente com uma sensação que esta marca de ter chego à um lugar que se propôs, já não fazia mais o menor sentido e não tinha mais a menor importância; isso são coisas do ego, deixemo-las para trás, desapeguemos, façamos como os antigos, que batiam a poeira das sandálias quando deixavam um lugar ingrato, mesmo porque me dei conta de quê, as coisas de grande valor que se encontram nas entrelinhas de uma aventura como essa, não estariam à nos esperar no destino porém, haviam ficado pelo Caminho.   

domingo, 6 de novembro de 2011

Viagem Serra do Sudeste / Lagoa dos Patos - parte 3



Já refeitos depois de uma boa noite de sono e nos sentindo um pouco mais animados em relação aos acontecimentos do dia anterior, tomamos café no hotel do Sr Eduardo, o Hotel e Churrascaria Goldas e  lá pelas 8:00 da manhã já estávamos na estrada de novo, agora com a intenção de chegar nesse mesmo dia enfim à Lagoa dos Patos, pelo município de Arambaré. Na parte da manhã percorremos um trecho com uma altimetria bem complicada, todo o trecho em estrada de chão e na sua maioria em subida.













Mas logo chegamos na localidade da Chuvisca onde paramos em um posto de combustível para um descanso e reabastecimento de água também. Após essa parada veio o melhor do trecho, saímos da Chuvisca por volta de 10:00 da manhã pela RS 350, deixamos a estrada de chão para trás e começamos descer em direção ao nível do mar, com o intuito de almoçar no município de Camaquã e fazer um reparo nos freios a disco da bike, que depois do tombo ficaram desalinhados. Tempo ensolarado, estrada com pouco movimento, asfalto e pedalando à descer, foi uma barbada; com umas três paradas ao longo do trecho às 11:30 da manhã já estávamos no trevo de acesso à Camaquã à 2 KM do centro da cidade.



















Almoçamos no restaurante do Clube Camaquense http://www.clubecamaquense.com.br/, uma comida pra lá de honesta e com preço muito bom também; fomos muito bem atendidos pelo proprietário e pelo Cris que acabou por nos dar informações importantes sobre a cidade.

Logo após o almoço nos dirigimos para a loja de bike's Triplo X, indicação do Cris onde recebemos um atendimento de primeira, o Jonatas e sua turma foram mais do que atenciosos conosco; aliás tai uma coisa que sempre me deixa impressionado na experiência com o cicloturismo, como diz um amigo meu:"a bicicleta chega antes"; é impressionante como as pessoas se tornam receptivas com quem está viajando de bike; em Camaquã não foi diferente.  

     









Com os freios consertados e uma aquisição do Mário na Triplo X, de uma bermuda com forro Coolmax  (mais do que necessário pra quem pretende fazer altas quilometragens sobre o banco de uma bicicleta) partimos em direção ao trevo na BR 116 que nos daria acesso ao município de Arambaré; e lá pelas 16:00 começamos a encarar uma pedalada de 30 km de estrada de chão, toda ao nível do mar, com uma paisagem de várzea e velhas figueiras, que com suas sombras se tornavam verdadeiros "oásis" para nós, pois naquela hora do dia, o sol ainda cobrava seu preço.


   













À partir do km 15 uma surpresa pra nós, o trecho dai para diante estava em pleno trabalho de terraplanagem, sendo preparado para o asfalto, logo não foi nada agradável pedalar sobre o cascalho durante os 15 km que ainda faltavam para a chegada em Arambaré, mas aventura é isso aí. 
   
 Mas o importante é manter em alta o bom humor e foi exatamente o que fizemos; ao longo desse trecho em uma das tantas paradas para o devido descanso, uma curiosidade: encontramos uma porteira com as cores do nosso Imortal Tricolor o Grêmio de Foot-baal  Portoalegrense http://www.gremio.net/ como a porteira se encontrava a corrente e cadeado e a fase do nosso time não era das melhores, sugeri pro Mário, para que fizéssemos  uma simulação e o devido registro fotográfico do que chamamos de: "a quebra da tranqueira das vitórias Tricolores", e não é que deu certo; pois dois dias depois deu Grêmio 4X2 em cima do Flamengo -e de virada- no famoso reencontro do "traíra" do Ronaldinho gaúcho com a casa que o criou (Estádio Olímpico Monumental). O episódio da porteira nos rendeu boas gargalhadas e ainda por cima, no fim da história, o nosso pequeno"rito" ainda funcionou.










Depois de muitas risadas e algumas pedaladas, ao final da tarde enfim chegamos as portas de Arambaré.

















Um impulso, pensar uma aventura, levá-la à cabo. Quantas "pedras" no caminho, quanta gente e histórias de gentes... Curiosos e sedentos são os inquietos, à se realizarem neste mundo; com viagens e mais histórias de gentes.

  Com os olhos no "Mar de Dentro"...

Obs.: segue o relato na próxima postagem.